quinta-feira, 30 de abril de 2020

TENTAÇÃO IX




Perco-me na tentação por não me importar de errar,
 em vão, 
ao me atrever arriscar, 
por terras do tão apetecido.

Há um risco indelével a separar dois actos.
O acto da tentação de um acto de uma boa ação. Isto porque, ambas se depresiam e desvalorizam quando saltam cá para fora sem guardar a chave, do que outrora, era um segredo.

Observo daqui tantos enredos em que me envolvi. As histórias que foram histórias e os momentos que não passaram de breves instantes.
Não há dúvidas de que,
nada voltará a ser como era dantes. Depois de um tempo de isolamento...

Nenhum sorriso será tão preciso ao se arredondar, num sentimento perpendicular, nos lábios de uma boca.
Nenhum beijo trará guardado no desejo o mesmo travo almiscarado de um já ivalidado passado, que passou.
Nenhum gesto será recordado com esperança, de ser resgatado. Quando no palco de um presente se amontuam, corpos sobrepostos, a um alegado prazer que a demência anulou.

Há uma espécie de ganância mundana, que nos instiga a desejar a tentação.
Há uma desleal emoção a pôr-nos constantemente à prova
Há vontades rebeldes a saltarem ininterruptamente à corda, dentro de nós. Como uma criança que não se cança de tentar, até alcançar em bicos de pé, o bolo mais colorido da vitrine.

Obreiro e realizador dos meus segredos vou-me arriscando,
perdendo-me de tentação em tentação,
eu vou ousando.
Transgredindo a métrica da sedução.
Sigo o meu norte,
sigo arriscando...
Atrevendo-me a violar as regras sem me importar de acertar com o rumo do destino
Que seja ele qual for o caminho, será sempre tão incerto.




quarta-feira, 29 de abril de 2020

AMOR DE CARNAVAL




Todo o amor que não abre mão de um passado é um amor subornado, 
por um presente que não vinga.

Mascarou-se
Pintou a cara
Desimulou-se
E no final chorou
Borrou o rosto
Desencantou-se...
Com o Carnaval que teimosamente vivia

segunda-feira, 27 de abril de 2020

MIGUEL TORGA



Aqui na minha frente a folha branca do papel, à espera;
dentro de mim esta angústia, à espera: e nada escrevo.
A vida não é para se escrever.
A vida
— esta intimidade profunda, este ser sem remédio, esta noite de pesadelo que nem se chega a saber ao certo porque foi assim —
é para se viver, não é para se fazer dela literatura.

quarta-feira, 22 de abril de 2020

EMOÇÕES




Se o passado tivesse cor,

 tudo ao nosso redor

seria

realmente presente


Não vivas noutra dimensão...

Não te percas da cor

Vive o que sentes

quarta-feira, 15 de abril de 2020

CHARLES BUKOWSKI




"Fazer algo perigoso com estilo é o que eu chamo de arte"

"O amor é uma espécie de preconceito. A gente ama o que precisa, ama o que nos faz sentir bem, ama o que é conveniente. Como se pode dizer que se ama uma pessoa quando há dez mil outras no mundo que você amaria mais se conhecesse? Mas a gente nunca conhece."

"O indivíduo bem equilibrado é insano"

"Talvez pensemos demais. Sinta mais, pense menos."

"Humanidade/bondade, nunca existiu nada disso desde o início."

"Os verdadeiros valentes vencem a sua imaginação e fazem o que devem fazer."

"Não há nada a lamentar sobre a morte, assim como não há nada a lamentar sobre o crescimento de uma flor. O que é terrível não é a morte, mas as vidas que as pessoas levam ou não levam até a sua morte."

"Há coisas piores do que estar só, mas costuma levar décadas até que o percebamos. E, frequentemente, quando o conseguimos, é demasiado tarde. E não há nada pior do que ser demasiado tarde."

"Sentia-me contente por não estar apaixonado, por não estar contente com o mundo. Gosto de estar em desacordo com tudo. As pessoas apaixonadas tornam-se muitas vezes susceptíveis, perigosas. Perdem o sentido da realidade. Perdem o sentido de humor. Tornam-se nervosas, psicóticas, chatas. Tornam-se, mesmo, assassinas."

"Que tempos difíceis eram aqueles: ter a vontade e a necessidade de viver, mas não a habilidade."

"A diferença entre uma democracia e uma ditadura consiste em que numa democracia se pode votar antes de obedecer às ordens."

"É preciso muito desespero, descontentamento e desilusão para escrever alguns bons poemas. Não é para todos nem escrevê-los ou mesmo lê-los."

"Dinheiro é como sexo - eu disse. - Parece muito mais importante quando a gente não tem..."

"se você não jogar, jamais irá vencer."

“Mulheres nasceram pra sofrer; não é de surpreender que peçam constantes declarações de amor.”

"Ela é louca, mas é mágica. Não há mentira no seu fogo."

"Como uma pessoa pode gostar de ser acordada diariamente pelo despertador às 6h30, pular da cama, se vestir rápido, comer depressa, cagar, mijar, escovar os dentes, pentear o cabelo, lutar contra um imenso engarrafamento para chegar a um lugar onde essencialmente se faz muito dinheiro para outra pessoa e ainda ter que agradecer por essa oportunidade"

segunda-feira, 13 de abril de 2020

A MATEMÁTICA DO DESAPEGO





Nunca em tempo algum se concebeu na escrita um pensamento, de uma mesma forma. Isto porque os sentimentos nunca pulsam duas vezes, num mesmo registo.

Há que aprender a soltar-se...
Há que aprender a matemática do desapego...
O deixar-se fluir, como uma folha de uma árvore, que sem saber muito bem para onde há de ir deixa-se cair ao acaso, de costas viradas para o mundo.
Há que aprender a desenvenselhar-se dos nós, dos embaraços, das hesitações, dos estorvos dos obstáculos... De nós, mesmos! A desatar as amarras do cais.
Há que aprender a deixar-se ir, para não se repetir nem se desgastar, desse para outro lugar. E sentir a liberdade de poder escolher ser livre.
Há que aprender a fechar os olhos ao escuro,  sem receios do imprevisível e inópinado futuro, que aí vem.
Há que aprender a sorrir, a rir a gargalhar mesmo que compulsivamente. Sem premeditar escolher o momento daquilo que se sente, para traduzir ao universo o pleno das emoções.

Em suma.. 
Há que aprender a nunca esperar pela vaga da vida. Como uma onda tão parecida quanto aquela que este instante aqui rebentou, sob a beira-mar desta praia, no seu ciclo natural das marés.
Acabando no branco da sua espuma por morrer.
Orfã de recordações.




sábado, 4 de abril de 2020

RECORDAÇÕES



Como tudo passa tão rápido, como tudo se transforma, sem nos apercebermos muito bem de que forma a forma nos vai (de)formando...
Lembro-me tão bem, de ti.
Era a camisa amarela do meu guarda roupa, ( guarda fatos, roupeiro, ou guarda vestidos...eu sei lá!) que eu mais gostava. Combinava tão bem com tudo, tão harmoniosamente bem que me assentava, tão bem que me sentia ao vestir a minha camisa amarela de manga curta. Combinava mesmo bem com tudo em mim. Desde os cabelos às farripas amarelas, passando pelo olhar sempre a sonhar de tons esverdeados e o sorriso envergonhado mas traquinas, o mais traquinas lá do bairro...
Como eu gostava de a vestir. Como eu sonhava que viesse o verão só para a sentir, no meu corpo, esses tons amarelados que me realçavam a satisfação por todo o lado, e mais ainda se os dias tivessem sido de praia. Como era fácil sentir-me bem, na ingenuidade de criança, por debaixo de uma peça tão peculiar de roupa.
Lembro-me que foi a minha eleita para ser vestida naquele que antigamente era um dos dias mais importantes, o dia das fotografias, para constar no passe da carris, no bilhete de identidade e no cartão de identificação da escola.
Nos dias em que a vestia sentia-me tão único, tão eu, tão bem que me sentia e assentava a minha camisa sempre muito bem engomada, e que, tenho a certeza que me iluminava para onde quer que eu fosse.
Contudo usei-a apenas duas, ou no máximo três estações, pois o meu corpo por essa altura não parava de crescer e eu sem me aperceber muito bem, fui germinando, fui crescendo, fui-me formando à forma que ainda hoje me (de)forma e vai formando.
Como casuais mudas de roupa, nas quais as vamos vestindo, despindo e usando, nas quais vamos  trocando e as esquecendo, algures num tempo, algumas das quais nos proporcionaram tanto, tanto, mas tanto.