segunda-feira, 11 de abril de 2022

SORRIDENTE




 Mijou prás mãos para aquecer a alma...

O vento frio daquela madrugada de Inverno fazia crer que a qualquer instante seria possivel ver um urso polar a bramir por ali.

Limpou ou melhor secou, as mãos às calças imundas, e em concha expirou fundo por entre o vácuo das palmas das suas mãos. 

A vida na rua tinha-lhe dado morada, há uns não sei quantos anos a esta parte.

E com a vida completamente enxuvalhada, os quadrados das pedras da calçada eram tatuados diáriamente sobre a demência nua, no corpo cru daquela disparidade.

Olhou para o alto, onde uma luz ainda acesa assinalava vida, ao longe embrutecida nos prédios daquele bairro, e sem  motivos... Sorriu.

O esquecimento era o seu maior dom, e por não trazer registo de um entristecer, sorria para tudo e por nada. Mesmo nos dias em que a fome, a chuva e o frio  apertavam, o seu sorriso era sempre preciso, na forma como enrugava as expressões, na contextualidade do seu rosto.

Aquela alma tinha-se perdido de um passado, tinha-se afastado tanto dos dias com sabor a rotina que sem carteira nem documentos que o identificassem à sua sina, por ali foi ficando... Sorridente.

Até o deambular do esquecimento o levar, daqui para acolá, para uma esquina um pouco mais além.

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