quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

FLAMEJADOS

Olhou-a nos olhos, respirou fundo e disse-lhe:
" amo-te" !!!
Sem mais delongas... Sem adjectivos nem parcimónias de uma qualquer compensação que sustenta com ênfase a palavra
Ela olhou para ele, sorriu e respondeu:
"Sempre fui tua"
Numa frase inteira que lhe roubou o fôlgo, e lhe depositou o coração na garganta. Num escorregadio sincero de dar ás fraquezas salpicos de nobreza, ao se declararem na sua debilidade


Voltaram a respirar fundo e atravessaram a estrada, sem nada prever que se mutilavam, sem nunca olharem um para o outro... Focados apenas nos movimentos adestrados, para não se denunciarem
E pisaram o alcatrão da passagem de peões, sabendo que se fintavam. Cruzaram-se lado a lado, seguindo cada um o seu caminho, seguindo cada qual o seu rumo (sem destino), seguindo apenas para lá, não fosse haver por cá indícios de se revelarem...
Ele dirigiu-se para o carro, e no seu passo apressado, fez um esforço enorme para não olhar para trás
Ela seguiu a voluptuosidade do seu andar, sentindo um desejo enorme de o abraçar, e de gritar ao mundo aquele segundo de tamanha arritmia

De um lado e do outro, em casas distintas nos cantos daquela cidade, nenhum deles sabia que todos os dias se beijavam .
Não calculavam que depois de tantos anos, ainda se amavam, não imaginavam que se roubavam às horas frenéticamente.
Conectando-se um ao outro, de segunda a domingo de manhã até o sol pôr. Não havendo dia que a telepatia não fizesse companhia em golfadas de suspiros
Ele era constante todos os dias. Um errante incessante com ela no seu pensamento
Ela recordava-se dele a cada momento, em que a divagação lhe arrebatava o espaço, no descompasso de uma subtracção que sem ser adição, somava tanta unidade nas formas como sentia um quente alento a morder-lhe  por dentro
E foram poetas nos sonhos...
Sonharam composições sublimes que não constaram nos livros. Iludiram os sonhos e os sentidos ao extremo, nas histórias que choraram. Saudaram recordações de jovens que foram irreverentes no beijo a cada esquina. Preservaram na memória uma glória de melodias intermitentes

A vida ao longe era vivida tão distante, que os anos só chegaram depois de envelhecerem
E sem saberem que se sonhavam, souberam que os sonhos não se realizavam ao ritmo das melodias que projectavam
Envelheceram sabendo que o sonho tinha um dia sido vivido intensamente, muito embora incompreendido no espaço entre dois corpos que se consumiram "na brasa"
Souberam a dada altura que a vida sempre engana os corpos sem chama, que não expõem cá fora o que por dentro lhes inflama
E sonharam até ao fim um sentimento guardado em segredo, que sem ser satisfeito foi um sonho perfeito nas formas como se alcançaram

O rancor não apaga o caminho dos sonhos mas desabriga a vida da sagacidade da sua cor

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